Fomento à permanência de mulheres estudantes do Ensino Médio e criação
de oportunidades para carreiras em STEM

Alessandra Ferreira dos Santos

alessandra.atacado@gmail.com

https://orcid.org/0000-0003-4762-9669

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

Ana Lara Casagrande

ana.casagrande@ufmt.br

https://orcid.org/0000-0002-6912-6424

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

Cristiano Maciel

cristiano.maciel@ufmt.br

https://orcid.org/0000-0002-2431-8457

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

Recibido: 21 de agosto del 2023 / Aceptado: 4 de octubre del 2023

doi: https://doi.org/10.26439/interfases2023.n018.6606

RESUMO. Neste estudo, pretende-se compreender como as políticas públicas podem mitigar os desafios complexos vinculados à desigualdade de gênero no Ensino Médio no Brasil. Discute-se o papel das políticas públicas para lidar com questões de gênero, com foco no Ensino Médio, etapa que possibilita a superação de desafios enfrentados pelas mulheres em suas trajetórias de estudos, principalmente nas carreiras STEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática).

PALAVRAS CHAVE: políticas públicas / desigualdade de gênero / Ensino Médio / evasão e abandono escolar / carreias STEM

Fomentar la permanencia de las mujeres en la enseñanza
secundaria y crear oportunidades para las carreras STEM

RESUMEN. El objetivo de este estudio es entender cómo las políticas públicas pueden mitigar los complejos desafíos vinculados a la desigualdad de género en la enseñanza secundaria en Brasil. Se discute el papel de las políticas públicas en el tratamiento de las cuestiones de género, con foco en la enseñanza media, etapa que permite superar los desafíos enfrentados por las mujeres en sus trayectorias de estudio, especialmente en las carreras STEM (Ciencia, Tecnología, Ingeniería y Matemáticas).

PALABRAS CLAVE: políticas públicas / desigualdad de género / educación secundaria / abandono escolar / carreras STEM

Encourage women to remain in secondary education and create opportunities for STEM careers

ABSTRACT. In this study, we intend to understand how public policies can mitigate the complex challenges linked to gender inequality in high school in Brazil. The role of public policies in dealing with gender issues is discussed, with a focus on high school, a stage that makes it possible to overcome challenges faced by women in their study trajectories, especially in STEM careers (Science, Technology, Engineering and Mathematics).

KEYWORDS: public policies / gender inequality / secondary education / school dropouts / STEM careers

1. Introdução

No âmbito do Ensino Médio, etapa final da Educação Básica brasileira, emerge uma problemática: a evasão escolar de gênero. Tal fenômeno aponta para a urgente necessidade de políticas públicas eficazes que abordem as complexas causas que levam as mulheres a abandonarem os estudos nesse estágio crucial da formação educacional. políticas essas (compreendidas em sentido amplo, estendendo-se aos programas e às ações direcionadas ao fim coletivo, como dimensão essencial do funcionamento da sociedade e cujo direcionamento se dá via Estado) que considerem os desafios mais complexos direcionados às mulheres e que deem suporte para mitigá-los. Elas são as jovens que deveriam estar na escola - isto é, compor as 7.866.695 matrículas registradas no Ensino Médio em 2022 (Censo da Educação Básica 2022: notas estatísticas, 2023), mas não estavam.

Embora jovens homens apresentem maiores taxas de distorção (aprovação, reprovação e abandono) no Ensino Médio (Censo da Educação Básica 2022: notas estatísticas, 2023), não se pode desconsiderar a quantidade de mulheres jovens que abandonam os estudos para atender às necessidades da prole, por exemplo.

No campo educacional, há que se considerar que, historicamente, parte significativa da sociedade foi alijada “do acesso a uma educação de qualidade socialmente referenciada está sempre à vida por qualquer migalha que lhe seja atirada” (Moura et al., 2015).

O recorte de gênero é pertinente (sobretudo alinhado ao fator sócio-econômico-racial), pois há elementos que impactam a permanência das jovens no Ensino Médio, como a gravidez. Dados importantes mostram uma proporção de 75,7% das meninas com idade entre 10 e 17 anos com filhos fora da escola (Fontoura e Pinheiro, 2009), “o que evidencia as dificuldades encontradas para engajar-se em alguma atividade fora de casa com um filho pequeno para cuidar” (Fontoura e Pinheiro, 2009). Impele-se a refletir sobre a maternidade como fenômeno de transição para a vida adulta com ressonâncias para o futuro e carreiras das mulheres.

Além disso, a carência econômica é citada por estudiosos como uma das principais causas para o abandono dos estudos (Gatsi et al. 2020). Outros fatores englobam: a falta de entusiasmo pela educação, uma sensação de desvalorização dentro do ambiente escolar, experiências negativas no contexto educacional (como métodos de ensino rígidos e falta de suporte por parte dos educadores e administradores) e a convicção das estudantes de que a vida fora da escola possui perspectivas mais favoráveis (Valencia et al., 2023). A literatura global também salienta a ausência de modelos inspiradores dentro das instituições de ensino como um elemento crucial para a retenção das estudantes (Chikhungu et al. 2020).

Ademais, a evasão escolar de estudantes do sexo feminino é influenciada tanto por fatores internos ao ambiente escolar quanto externos a ele, afetando a formação das jovens (Chikhungu et al. 2020). Aspectos como desempenho acadêmico insatisfatório, repetência, idade avançada, baixa qualidade educacional, falta de referências positivas e longas distâncias de deslocamento são alguns dos desafios intrínsecos à instituição escolar. No âmbito externo, a pobreza, casamentos prematuros e forçados, gravidez, bem como atitudes desfavoráveis por parte dos pais em relação à educação das mulheres, desempenham um papel significativo (Shoshana, 2020).

Dahal et al. (2019) destacam que alguns aspectos como: a dimensão de gênero no contexto escolar; um ambiente desfavorável para mulheres durante o período menstrual; a ausência de locais na escola que permitam que elas preservem sua privacidade; e, a escassez de professoras nas instituições educacionais - indicam a contribuição das escolas para que a geração de desigualdades de poder se perpetue dentro do sistema escolar.

Nesse contexto, o programa Parent in Science surge como uma resposta direcionada à luta contra os desafios enfrentados pelas mães cientistas, abraçando a missão de promover a igualdade de gênero. Através de recursos, orientação e eventos, o programa visa a conscientização sobre as barreiras que as mães cientistas enfrentam, ao mesmo tempo que facilita redes de apoio, permitindo o equilíbrio entre suas responsabilidades parentais e atividades acadêmicas (Parent in Science, 2023). Uma de suas iniciativas visa desenvolver e aprimorar políticas para impulsionar a igualdade de gênero, garantindo oportunidades equitativas para mães e cuidadoras progredirem em suas trajetórias profissionais. O programa reconhece que enfrentar os desafios de igualdade e inclusão em STEM requer uma abordagem que leve em consideração várias dimensões interligadas (Parent in Science, 2023).

Diante disso, foi conduzido um levantamento bibliográfico com o propósito de explorar a relação entre a evasão e abandono escolar de jovens mulheres no Ensino Médio e suas consequências na formulação de planos futuros e trajetórias profissionais. Além disso, buscou-se examinar o papel das políticas públicas na abordagem das questões de gênero, com um enfoque particular no Ensino Médio. Essa etapa educacional emerge como um cenário propício para a superação dos obstáculos que as mulheres enfrentam em suas jornadas educacionais, sobretudo nas carreiras STEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática).

Portanto, o propósito central deste estudo é compreender como as políticas públicas podem mitigar os desafios complexos vinculados à desigualdade de gênero no Ensino Médio no Brasil.

2. Metodologia

Esta pesquisa consiste em uma revisão bibliográfica de abordagem qualitativa. De acordo com Gil (2022), a condução de uma pesquisa bibliográfica, semelhante a qualquer outra investigação, segue uma série de etapas. O número e a ordem dessas etapas podem variar dependendo de diversos fatores, como a complexidade do problema em questão, o nível de conhecimento do pesquisador sobre o tema, e o grau de precisão desejado na pesquisa.

No entanto, Gil (2022) aponta que, com base na experiência acumulada pelos especialistas, pode-se afirmar que a maioria das pesquisas bibliográficas segue, pelo menos, as etapas a seguir: escolha do tema; levantamento bibliográfico preliminar; formulação do problema; elaboração do plano provisório da pesquisa; identificação das fontes; localização das fontes; obtenção do material de interesse para a pesquisa; leitura do material; tomada de apontamentos; fichamento; construção lógica do trabalho e por último, a redação do relatório.

Nessa perspectiva, as buscas se basearam na seguinte pergunta norteadora: como a evasão escolar de jovens mulheres no Ensino Médio afeta a construção de seus projetos de futuro e carreiras, e quais são as implicações dessa relação? Dentro desse contexto, a investigação bibliográfica foi realizada nas bases de dados Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Science Direct, Google Acadêmico, finalizada com uma busca manual nas listas de referências dos trabalhos elegidos. A busca compreendeu os seguintes descritores: Políticas públicas; desigualdade de gênero; STEM; juventudes; Ensino Médio; evasão e abandono escolar. Foram incluídos na investigação artigos originais, de revisão e literatura cinzenta no idioma português.

Desse modo, os resultados da presente revisão bibliográfica, visão apresentar estudos e políticas públicas afim de mitigar o cenário de evasão e abandono escolar das jovens do Ensino Médio. Assim, ponderando as temáticas pertinentes à pergunta norteadora, os resultados foram subdivididos em três seções. A primeira seção trata-se sobre a Carreira e possibilidades direcionadas às jovens. Na segunda aborda-se sobre a permanência na escola e suporte para o futuro das juventudes brasileiras. Por fim, nas considerações finais são preconizadas algumas perspectivas para a discussão sobre a evasão e abandono escolar entre jovens no Ensino Médio e suas desigualdades de gênero assim como, os impactos as oportunidades futuras.

3. Carreira e possibilidades direcionadas às jovens

No contexto educacional, os termos “abandono escolar” e “evasão escolar” são frequentemente empregados para descrever situações em que estudantes interrompem sua frequência às aulas, mas com nuances distintas. O abandono escolar ocorre quando um estudante deixa de participar das atividades escolares antes de concluir o período letivo ou ciclo educacional, podendo ser influenciado por diversos fatores individuais (Silva et al., 2017; Lima et al., 2022). O Instituto de Estatística da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) define o abandono como a “proporção de alunos de uma coorte matriculada em uma determinada série em um determinado ano escolar que não está mais matriculado no ano escolar seguinte” (Unesco, 2009).

Por outro lado, a evasão escolar é um fenômeno mais abrangente, indicando a saída definitiva de estudantes de uma instituição ou sistema educacional, frequentemente relacionada às questões estruturais, socioeconômicas e de qualidade de ensino. Ambos os cenários impactam negativamente o acesso à educação e o desenvolvimento acadêmico, exigindo abordagens específicas para enfrentar esses desafios (Dore e Lüscher, 2011).

O caráter permanente da evasão faz com que ela se torne um grande desafio. Para preveni-la, é fundamental garantir um ambiente escolar inclusivo, com uma infraestrutura física adequada, um corpo docente capacitado e comprometido, além de ampliar as opções de cursos em tempo integral, idiomas e capacitação digital (Anuto, 2013). Para a melhoria do sistema educacional é essencial um compromisso conjunto, perpassado pela atuação do Estado.

Verifica-se uma desigualdade de gênero em determinadas carreiras, sobretudo nas STEM, e uma disparidade na presença feminina nos cursos de Tecnologia da Informação. Um problema influenciado por diversos fatores, tais como a predominância masculina, a falta de modelos femininos e obstáculos como a falta de informações sobre oportunidades, a desigualdade de tratamento, o assédio e o preconceito, que prejudicam a confiança das jovens no pensamento científico e estão relacionados ao gênero, o que resulta em altas taxas de evasão (Santana et al., 2017).

Essa disparidade pode ser reduzida quando mulheres jovens têm igual confiança em suas habilidades. Iniciativas de empoderamento como a promoção da autonomia, o acesso aos recursos de capacitação, a autoconfiança e a proatividade podem reduzir a evasão nos cursos de Tecnologia da Informação e aumentar a presença das estudantes em carreiras científicas (Santana et al., 2017).

Além disso, um estudo nos Estados Unidos (Mau e Li, 2018) com estudantes do Ensino Médio mostrou que a rede de apoio familiar, a influência da escola e a autoeficácia profissional são importantes na tomada de decisão de carreira nas áreas STEM por estudantes sub-representados, como mulheres. Observa-se que os três aspectos elencados podem também aplicar-se à realidade brasileira, de modo que se acredita que as políticas públicas promotoras de uma cultura inclusiva e equitativa nas escolas são importantes para que essas estudantes se sintam apoiadas e incentivadas a dar sequência nas carreiras. Desse modo, políticas públicas que promovam uma cultura inclusiva e equitativa nas escolas são importantes para que essas estudantes se sintam apoiadas e incentivadas a dar sequência nas carreiras.

Há algumas estratégias sendo adotadas no Brasil para fomentar uma cultura inclusiva e equitativa nas escolas, visando o apoio e incentivo às estudantes em suas trajetórias educacionais e carreiras. Isso inclui a implementação de políticas educacionais promotoras da igualdade de gênero, programas de capacitação para docentes, desenvolvimento de currículos abordando temas de gênero, acesso a recursos educativos diversificados, criação de clubes e grupos de apoio, estímulo à participação em áreas STEM, campanhas de conscientização, apoio financeiro e sistemas de avaliação para monitoramento contínuo dos progressos alcançados. Tais medidas combinadas potencialmente criam um ambiente educacional mais inclusivo e diversificado, incentivando os estudantes a trilharem carreiras por meio de escolhas desgarradas de preconceitos (Maia Vidal et al. 2022; Souto e Souto 2022).

Nesse contexto, a seção subsequente tratará de algumas medidas governamentais do Brasil que têm como objetivo promover uma atmosfera de inclusão e igualdade nas instituições escolares. Essas políticas buscam respaldar e estimular as mulheres estudantes ao longo de suas jornadas educativas e profissionais.

4. Permanência na escola e suporte para o futuro das juventudes brasileiras

No Brasil, o Estatuto da Juventude, em vigor desde 2013, estabelece diretrizes para as políticas públicas direcionadas às juventudes, do qual deriva o Sistema Nacional de Juventude. Esse sistema visa promover o acesso a serviços como educação, saúde, cultura, etc., além de fomentar a inclusão social, a participação cidadã e o respeito à diversidade Brasil (2013). Aborda-se o conceito de juventudes, no plural, como modo de contemplar a multiplicidade que a categoria congrega na sociedade brasileira.

O Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, através da Lei 14.214/2021 pode ser um exemplo de política pública que subsidia a permanência na escola. Ela determina que as cestas básicas contenham, obrigatoriamente, itens essenciais para higiene, dentre eles, o absorvente higiênico feminino. Segundo da Silva e Lopes (2022), a falta de instalações adequadas, tanto nas casas quanto nas escolas, resulta em múltiplos obstáculos para os jovens preservarem a higiene menstrual de maneira digna e segura. Como resultado, a ausência de condições apropriadas para essa higiene contribui para a evasão escolar.

Com vistas a promover a expansão das perspectivas futuras das jovens nas carreiras STEM, há o Programa Meninas Digitais. Criado em 2011 na Secretaria Regional do Mato Grosso, da Sociedade Brasileira de Computação e institucionalizado por esta sociedade em 2015, ele visa disseminar a computação e tecnologia entre meninas e mulheres, contribuindo para reduzir as desigualdades de gênero nesse campo e fortalecer a representatividade feminina (Ribeiro et al., 2020).

Embora não seja de diligência estatal, destaca-se o projeto supracitado pelo foco na equidade de gênero e inspiração para a orientação de ações nesse âmbito. Além de incentivar mulheres a buscarem carreiras científicas e tecnológicas, o projeto aborda questões de gênero em diversas profissões e fomenta as lideranças femininas (Lima et al., 2022).

O programa e seus PROJETOS parceiros realizam uma variedade de atividades, como eventos, oficinas, palestras, pesquisas e criação de materiais. A divulgação é feita por meio de websites, redes sociais, eventos nacionais e internacionais, com um comitê administrativo dedicado à disseminação do campo da Computação, como exemplo temos o projeto Meninas Digitais Mato Grosso (Lima et al., 2022).

5. Considerações finais

A evasão e o abandono escolar entre jovens estudantes do Ensino Médio gera impactos nas oportunidades de emprego, menor renda, barreiras para o desenvolvimento pessoal e profissional, entre outros. Além da perpetuação dos ciclos de carência sócio-econômico-cultural, que dimanam na desigualdade de gênero. Assim, ressalta-se a importância de políticas públicas que promovam a igualdade de gênero na educação e incentivem a permanência das mulheres no sistema educacional.

Nesse sentido, na escola é possível explorar o potencial das juventudes para seu desenvolvimento, para o exercício da cidadania e para sua qualificação profissional, logo, a não participação nesse espaço formativo afeta diretamente as escolhas e a projeção de futuro em carreiras promissoras, especialmente para os jovens do Ensino Médio. Portanto, a implementação da ação e das políticas públicas elencadas é imprescindível para combater de forma institucional as discrepâncias no acesso às oportunidades.

Agradecimentos

A concretização desta pesquisa foi viabilizada por meio do apoio do International Development Research Centre - IDRC, da Fundação de Apoio e desenvolvimento da Universidade Federal de Mato Grosso - UNISELVA, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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